Tecendo destinos
O Projeto de criação do Centro de Memória Michie Akama é a melhor forma de contar uma história de alguém que teceu destinos, criou possibilidades e estabeleceu pontes entre mundos, ideias e vidas.
Isto porque falar de Michie Akama significa falar do universo feminino deslocado no tempo e no espaço a partir de uma experiência de vida e imigração. Tomada em seu contexto histórico, sua vida reflete profundas marcas de uma cultura milenar ao mesmo tempo em que assistia o mundo ser completamente reconfigurado a partir das Duas Grandes Guerras. Definitivamente não eram poucos os desafios e as dificuldades a transpor.
Um Centro de Memória, neste caso, remete ao tratamento e cuidado de acervos que tratam de todas estas condicionantes e variáveis. Como fios que tecem e ajudam a costurar destinos a Educação e a Cultura que serviram de base para Michie Akama oferecem a exata medida das bases em que se ergueram os ideais da Fundação que leva seu nome. São Paulo, era um ponto atrativo de vinda e distribuição de colônias por todo o estado e por regiões mais interioranas que se distribuíam por outras regiões e até estados.
Os personagens de nossa história são uma professora e um pesquisador formado em Oceanografia. O jovem casal, Jiuji e Michie Akama, desembarca com seus sonhos no princípio da década de 1930.
Mas afinal, quem era Michie Akama?
Michie Akama nasceu no dia 18 de Setembro de 1903, na aldeia de Kawasaki no Distrito de Shibata, Província de Miyagui, no nordeste do Japão.
Formada pela “Escola Técnica Feminina Watanabe” de Tokyo, atual “Faculdade Doméstica de Tokyo”, em 1922. Diplomada em 1924 pela “Escola Normal Municipal de Tokyo”, lecionou por cinco anos na antiga “Escola Profissional” na cidade de Sendai, a atual “Universidade Mishima”. Imigrou ao Brasil em 1930, acompanhando seu esposo Jiuji Akama no navio “Montevideo Maru”.
Seu marido, Jiuji Akama, era formado em Oceanografia pela “Universidade Imperial de Hokkaido”. Era professor da “Escola de Navio Mercante e Produção Marítima da Província de Shimane.
Diferente do sonho que possuíam, Jiuji Akama não conseguiu integrar-se à área de pesca como imaginava, e isso levou o casal a um primeiro momento trabalhar no interior de São Paulo em uma fazenda de café, e posteriormente decidirem fixar residência na capital e iniciar o empreendimento educacional que veio a chamar-se “São Paulo Saihou Jogakuin”.
Em formato de internato, a educação era voltada exatamente para jovens descendentes nipônicas que vinham de todos os lugares do interior de São Paulo para ter incialmente a formação em Corte e Costura. À medida que o tempo passou essa grade curricular foi aumentando e você pode conhecer mais sobre ela e suas práticas na página “Uma ideia, um caminho“, onde contamos em detalhes estes primeiros tempos.
Precisamos pensar que as redes de deslocamento e transporte não favoreciam idas e vindas diárias, e seria preciso que tais jovens permanecessem no local de estudo indo visitar as famílias em apenas algumas datas especificas. Por isso, o internato era a escolha natural.
A trajetória de Michei Akama nunca passou desapercebida nem por seus pares nem pela comunicada educativa tanto brasileira como nipônica. Foram provas disso as diferentes homenagens, distinções e medalhas que recebeu no decurso de sua trajetória.
Dentre elas, não podemos deixar de citar:
A Comenda José Bonifácio (1967), a Medalha Anchieta pela Câmara Municipal de São Paulo (1973), a Comenda Zuihoushou de 5º Grau do Governo Japonês dada diretamente pelo Imperador Hiroito no dia 29 de abril de 1974 (no dia do 73º aniversário do soberano), a Medalha Ana Neri (1977), a Comenda Ordem do Ipiranga pelo Governo do Estado de São Paulo (1983) e uma Homenagem da Reitoria da Universidade de São Paulo na Segunda Solenidade à Imigração Japonesa (2001).
Pela ordem as conheça abaixo:
Além destas homenagens, também em 1974, Michie Akama recebeu a Nippon Seifuku no Kungotôzuihôshô (a Ordem do Tesouro Sagrado do Governo Japonês) e foi considerada uma das 20 personalidades do século XX da Colônia japonesa.
A relevância e importância desta educação oferecida por Michie Akama pode ser evidenciada por seus números:
Durante quatro décadas, cerca de 5 mil mulheres passaram pelo internato.
Mas as transformações sociais ocorridas no período pós-guerra e nos períodos posteriores, levaram à necessidade do fortalecimento dos valores ensinados no “São Paulo Saihou Jogakuin” e a busca por ampliar seu universo de atuação. Assim em 1960, a escola passou a se chamar Fundação Instituto Educacional Dona Michie Akama. Como forma de viabilizar isso, a fundadora abriu mão de todo o seu patrimônio e o destinou aos objetivos educacionais.
O primeiro passo para materializar o sonho de ter um local onde a educação tivesse meios de crescer e atingir um bom número de alunos seria procurar por um terreno que pudesse comportar este sonho.
Isto porque a escola enfrentava sempre problemas de onde se fixar, já que até então suas sedes eram alugadas. Por exemplo, em 1943 a escola teve que desocupar o prédio da Rua Tamandaré, mudando-se para a Rua Vergueiro, 235. Em janeiro de 1944, instalaram-se num prédio na rua Vergueiro, 2625, que passou a ser a matriz. Mas ambas eram alugadas, e a campanha para a aquisição da sede própria começou em 1947, após o fim da Guerra.
Somente no ano de 1965 que se conseguiu o terreno onde se iniciaria a construção do prédio da Fundação, tendo como responsáveis técnicos os arquitetos Yoshikazu Morita e Antonio Akama.
Importante compreender que a Fundação precisou ir se adaptando aos tempos e aquilo que se esperava de suas jovens alunas.
Se em um primeiro momento costurar, cozinhar, bordar eram atributos necessários, à medida que o tempo passou deixou de ser uma demanda que justificasse número de matriculas.
Com o aumento de oferta de roupas prontas, por exemplo, as alunas interessadas em se matricular para os cursos de corte e costura forma diminuindo. Com o aumento de oferta de meios de transporte, o número de jovens que deixavam de optar pelo internato também diminuía. Era preciso encontrar alternativas.
Mas quais seriam elas?
A Fundação Instituto Educacional Dona Michie Akama foi inaugurada em 1958, visando crescer e adequar-se dentro da nova realidade, a integração com a sociedade brasileira.
A construção do prédio atual, na Vila Clementino, teve início em 1965 e no começo da década de 70 foi inaugurado o Centro Educacional Pioneiro. Nesta nova fase, a instituição foi aberta para meninos e começava a focar como objetivo principal o ensino infantil e fundamental, nos moldes regulares.
O nicho seria outro, e caberia buscar pequenos alunos para cuidar de sua formação integral.
A primeira série do antigo Primeiro Grau teve início em 1971. Era a primeira turma do Youtien (jardim da infância ministrado em língua japonesa)
Dona Michie Akama assistiu o crescimento e o desenvolvimento de tudo o que havia plantado e ao nos deixar, após mais de 100 anos bem vividos e todos eles dedicados à Educação, podia olhar para trás e ver confirmado que ter um sonho e o realizar era a mais gratificante de todas as missões.
Destinos haviam sido tecidos à medida que que o seu próprio se tramava aos fios de seu próprio destino.
Para compreender mais sobre este percurso de escolha e caminhos, não deixe de ler nossas páginas:
Um Lugar, um Sonho
&
Uma Ideia, um Caminho
Bibliografia de Referência:
Akama, Regina Chiga.”A formação da identidade feminina: reconstruindo a memória e a história de vida de ex-alunas do internato São Paulo Saihou Jogakuin”. Dissertação de Mestrado – Campinas, SP: [s.n.], 2008